Como sem mais nem porque, ele
acordou. Estirado num gramado tão verde sob o céu azul, impossível não
acreditar que estava vivo. Faltava-lhe o ar, mas, estava acordado. Sob aquele
manto azul, entendia que logo iria ser noite…sentou-se escorando num tronco de
árvore velho e seco, a cada vez que aproximava ao tronco, ouvia o estalar
daquela casca velha. Cabeça tão vazia, cabeça tão limpa... ele se
percebeu só.
Não ficou ali por muito tempo e se pôs
andar, lembrou do seu redor, e não estranhou tudo aquilo: o rio, as árvores, o
gramado, a brisa leve e ao mesmo tempo quente... Continuou ... Ele e ele. Ao
longe ouve uma melodia... todo seu corpo reage aquela doce melodia... e por
instantes, para como uma estátua.... “ Conheço essa
música...ah!!!” E seu corpo treme e dança...uma dança quieta, uma
dança de dois, não de um.... A melodia entra em seus ouvidos, arrepiando seu
corpo, inquietando suas pernas e braços.... E dança... uma dança tímida...
olhos fechados... parado... em seu momento único ele a vê...ali, a sua frente...
cabelos negros, braços cobertos por um lenço de seda...seda vermelho...ainda
que ela dance em sua frente, ele segue paralisado sem mais nem por que...a
melodia ganha aquele prado...
Subitamente abre os olhos. Ela não
está ali. A melodia sim. Já é noite. Caminha até o rio... calmo, e entre
as copas não percebe que há uma lua. Lua de prata... e casa com o som da doce
melodia... ele conhece a melodia, de onde? Encosta em uma árvore e espera.
“Será que ela virá? ” – Pensa..., “
mas ... quem virá???” – Pergunta a ele mesmo... “Será
que ela me esqueceu??”... “Ela virá...” afirma a si mesmo
... um diálogo entre ele mesmo o deixa aflito, pois não sabia de fato o que
estava fazendo ali, e quem era ELA? Um apelo e uma agonia tomam conta e a
confusão do momento não permite mais o diálogo. Sem perguntas, sacode a cabeça,
tenta afastar todo aquele embaraço, não basta exatamente nada o que vê ao seu
redor é tudo muito surreal...onde ele estava afinal?
Encostado a árvore irrita-se com
música …precisava saber de onde vinha... quem era o músico... e, o peito aberto
resolver dar passos duros até a música... sem medo, talvez o desafio daquela
melodia era o que fizera chegar ali... entre trilhas iluminadas pela lua,
margeando o rio ele quase esquece o propósito... agora caminha devagar e um
perfume adocicado invade seu caminho. Como um cão de caça, ele para respira
o aroma. Fecha os olhos, e finalmente se rende... ao perfume... a música... ao
luar... um mundo de saudades invade seu peito... uma tristeza enche seus
olhos de lágrimas... é só sofrimento... de repente, sente em seu rosto um
pesar de mãos... mãos envolvem seu rosto como uma máscara, mãos suaves e
conhecidas... sem temer, ele toca...” ah! Ela voltou! ” ...desliza suas mãos
naquelas mãos, chegando ao pulso... reconhece as pulseiras, reconhece o anel...
E noutra mão reconhece...reconhece a
aliança... abre os olhos... e se vira para ela... “oh! Minha amada!
Quantas saudades...” lamenta o pobre homem... “Meu amado...
não sofras... não sofras mais…”...” Impossível... desejo a morte todos os dias,
desde o dia que se foi... impossível tê-la de volta! Quão triste e vazio é
meu mundo...”. Seguia o diálogo do casal apaixonado, separado, mas,
apaixonado. “Onde estou!? Como vim parar aqui?? O que fazes aqui???” –
Dizia o homem, acariciando nervosamente a mulher, ora os cabelos, ora o
rosto... e para cada palavra, cada intervalo, beijos, beijos na face, beijos na
boca, beijos nas mãos... – “o que fazes aqui? Como vim parar aqui!???”, finalmente
agarra o rosto da mulher e fita... “como? Como? ”.
Nebulosamente
o sentimento de saudades que tomava contava daquele casal, agora é substituído pela
alegria do reencontro. A música, a lua, tudo estava perfeito. Tudo fora de
fato, presente de Deus e para ele somente bastava olhar uma vez mais antes do
adeus...Tudo que vivera anos agora, sentia outra vez... A amava sim, e cada vez
mais amava mais.
Ajoelham próximo
ao rio, e como antes, ela acaricia seus cabelos e por segundos, contemplam a
paisagem e o silêncio se rompe... “ há muito mistérios, nada sabemos de nós,
sequer sabemos se voltaremos a nos ver, o que perpetua é esse nosso amor. É
preciso seguir. Imploraste por esse encontro, precisei prometer que esse seria
nosso último encontro, que não mais me verias. Onde estou rezo por ti, emano vibrações
para o seu dia a dia, segue tua vida, é temporário nossa separação. Cuide de
você. Não atrase o curso das coisas, prometemos aceitar as condições. Nossas
vidas estarão para sempre entrelaçadas...para sempre. Terás sempre meu eterno
amor, mas, preciso seguir. Você precisa seguir. Não se entristeça, não se
revolte, agradeça ao Pai pelo nosso encontro, mas, meu amado, é preciso seguir…”,
e não olhar frio, ele a fita na menção de interromper, e ela delicadamente
toca seus lábios com o lenço.... “ Não... não faça isso...você aceitou...eu
também”...
E ele se
cala. E relembra o adeus. Relembra de tudo que ficou sem ela. Permanece de olhos
fechados, queria tudo daquele encontro, o seu perfume, o som de sua voz... e a
música... essa música... que não para de tocar... respira fundo, aceita novamente
o juramento, sabe que não irá cumprir.
Abre os olhos e a vê, e sabe que pela última vez de sua existência, nunca mais
seus abraços, seus beijos, nunca mais sua voz... nunca mais ela...permanece estático,
querendo chorar, gritar, mas, aquele abraço...confortava a dor. Ela estava indo.
Estava novamente partindo, tal qual como prometeu: nada faria para impedir,
aceitaria. Vez ou outra cerrava os olhos não querendo ver a cena do outro
adeus. E assim foi, mansamente ela dissipando ante seus olhos, e simultaneamente
dentro de seu peito, o coração parecendo explodir. Já conhecia aquela dor, pediu
a mesma morte...a última imagem o sorriso breve e calmo de sua amada…Ainda de
olhos abertos ele chorou e tocou o vazio. Ela de fato havia partido. Ela o
deixou. Como antes, ajoelhou e chorou por muito tempo.
O telefone
tocou. Confuso ele despertou... “alô?? alô???”
Enquanto espera, ele olha a janela, e com o dedo indicador afasta a cortina e
curiosamente um carro estacionado em frente a sua janela, um casal esperando o
farol abrir, o motorista aumenta a música…aquela música.... Hipnoticamente
relembra de tudo, e do juramento... olha para o céu azul e num riso triste diz:
- Seguirei
sem você. Estou bem. Estou em paz.

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