quarta-feira, 8 de junho de 2016

Vida que se segue

Como sem mais nem porque, ele acordou. Estirado num gramado tão verde sob o céu azul, impossível não acreditar que estava vivo. Faltava-lhe o ar, mas, estava acordado. Sob aquele manto azul, entendia que logo iria ser noite…sentou-se escorando num tronco de árvore velho e seco, a cada vez que aproximava ao tronco, ouvia o estalar daquela casca velha.  Cabeça tão vazia, cabeça tão limpa... ele se percebeu só.
Não ficou ali por muito tempo e se pôs andar, lembrou do seu redor, e não estranhou tudo aquilo: o rio, as árvores, o gramado, a brisa leve e ao mesmo tempo quente... Continuou ... Ele e ele. Ao longe ouve uma melodia... todo seu corpo reage aquela doce melodia... e por instantes, para como uma estátua....  “ Conheço essa música...ah!!!” E seu corpo treme e dança...uma dança quieta, uma dança de dois, não de um.... A melodia entra em seus ouvidos, arrepiando seu corpo, inquietando suas pernas e braços.... E dança... uma dança tímida... olhos fechados... parado... em seu momento único ele a vê...ali, a sua frente... cabelos negros, braços cobertos por um lenço de seda...seda vermelho...ainda que ela dance em sua frente, ele segue paralisado sem mais nem por que...a melodia ganha aquele prado...
Subitamente abre os olhos. Ela não está ali. A melodia sim.  Já é noite. Caminha até o rio... calmo, e entre as copas não percebe que há uma lua. Lua de prata... e casa com o som da doce melodia... ele conhece a melodia, de onde? Encosta em uma árvore e espera.
“Será que ela virá? ” – Pensa..., “ mas ... quem virá???” – Pergunta a ele mesmo...  “Será que ela me esqueceu??”... “Ela virá...” afirma a si mesmo ... um diálogo entre ele mesmo o deixa aflito, pois não sabia de fato o que estava fazendo ali, e quem era ELA? Um apelo e uma agonia tomam conta e a confusão do momento não permite mais o diálogo. Sem perguntas, sacode a cabeça, tenta afastar todo aquele embaraço, não basta exatamente nada o que vê ao seu redor é tudo muito surreal...onde ele estava afinal?
Encostado a árvore irrita-se com música …precisava saber de onde vinha... quem era o músico... e, o peito aberto resolver dar passos duros até a música... sem medo, talvez o desafio daquela melodia era o que fizera chegar ali... entre trilhas iluminadas pela lua, margeando o rio ele quase esquece o propósito... agora caminha devagar e um perfume adocicado invade seu caminho. Como um cão de caça, ele para respira o aroma. Fecha os olhos, e finalmente se rende... ao perfume... a música... ao luar... um mundo de saudades invade seu peito... uma tristeza enche seus olhos de lágrimas... é só sofrimento... de repente, sente em seu rosto um pesar de mãos... mãos envolvem seu rosto como uma máscara, mãos suaves e conhecidas... sem temer, ele toca...” ah! Ela voltou! ” ...desliza suas mãos naquelas mãos, chegando ao pulso... reconhece as pulseiras, reconhece o anel...  E noutra mão reconhece...reconhece a aliança... abre os olhos... e se vira para ela... “oh! Minha amada! Quantas saudades...” lamenta o pobre homem... “Meu amado... não sofras... não sofras mais…”...” Impossível... desejo a morte todos os dias, desde o dia que se foi... impossível tê-la de volta! Quão triste e vazio é meu mundo...”. Seguia o diálogo do casal apaixonado, separado, mas, apaixonado. “Onde estou!? Como vim parar aqui?? O que fazes aqui???” – Dizia o homem, acariciando nervosamente a mulher, ora os cabelos, ora o rosto... e para cada palavra, cada intervalo, beijos, beijos na face, beijos na boca, beijos nas mãos... – “o que fazes aqui? Como vim parar aqui!???”, finalmente agarra o rosto da mulher e fita... “como? Como? ”.
Nebulosamente o sentimento de saudades que tomava contava daquele casal, agora é substituído pela alegria do reencontro. A música, a lua, tudo estava perfeito. Tudo fora de fato, presente de Deus e para ele somente bastava olhar uma vez mais antes do adeus...Tudo que vivera anos agora, sentia outra vez... A amava sim, e cada vez mais amava mais.
Ajoelham próximo ao rio, e como antes, ela acaricia seus cabelos e por segundos, contemplam a paisagem e o silêncio se rompe... “ há muito mistérios, nada sabemos de nós, sequer sabemos se voltaremos a nos ver, o que perpetua é esse nosso amor. É preciso seguir. Imploraste por esse encontro, precisei prometer que esse seria nosso último encontro, que não mais me verias. Onde estou rezo por ti, emano vibrações para o seu dia a dia, segue tua vida, é temporário nossa separação. Cuide de você. Não atrase o curso das coisas, prometemos aceitar as condições. Nossas vidas estarão para sempre entrelaçadas...para sempre. Terás sempre meu eterno amor, mas, preciso seguir. Você precisa seguir. Não se entristeça, não se revolte, agradeça ao Pai pelo nosso encontro, mas, meu amado, é preciso seguir…”, e não olhar frio, ele a fita na menção de interromper, e ela delicadamente toca seus lábios com o lenço.... “ Não... não faça isso...você aceitou...eu também”...
E ele se cala. E relembra o adeus. Relembra de tudo que ficou sem ela. Permanece de olhos fechados, queria tudo daquele encontro, o seu perfume, o som de sua voz... e a música... essa música... que não para de tocar... respira fundo, aceita novamente   o juramento, sabe que não irá cumprir. Abre os olhos e a vê, e sabe que pela última vez de sua existência, nunca mais seus abraços, seus beijos, nunca mais sua voz... nunca mais ela...permanece estático, querendo chorar, gritar, mas, aquele abraço...confortava a dor. Ela estava indo. Estava novamente partindo, tal qual como prometeu: nada faria para impedir, aceitaria. Vez ou outra cerrava os olhos não querendo ver a cena do outro adeus. E assim foi, mansamente ela dissipando ante seus olhos, e simultaneamente dentro de seu peito, o coração parecendo explodir. Já conhecia aquela dor, pediu a mesma morte...a última imagem o sorriso breve e calmo de sua amada…Ainda de olhos abertos ele chorou e tocou o vazio. Ela de fato havia partido. Ela o deixou. Como antes, ajoelhou e chorou por muito tempo.
O telefone tocou.   Confuso ele despertou... “alô?? alô???” Enquanto espera, ele olha a janela, e com o dedo indicador afasta a cortina e curiosamente um carro estacionado em frente a sua janela, um casal esperando o farol abrir, o motorista aumenta a música…aquela música.... Hipnoticamente relembra de tudo, e do juramento... olha para o céu azul e num riso triste diz:
- Seguirei sem você. Estou bem. Estou em paz.









Nenhum comentário:

Postar um comentário